Neste Domingo, reflectindo as leituras bíblicas propostas pela Liturgia da Igreja, recordo-me de uma pequena oração que aprendi na infância: Meu Deus, eu creio em Vós, mas aumentai a minha fé. Com esta prece, sinto que me coloco nas mãos de Deus. Pedimos muitas coisas a Deus, pelos nossos doentes, pelos nossos defuntos, pelos desempregados, pelas vítimas da violência, pela paz, pelos jovens, etc., e fazemos bem. Mas o texto do evangelho deste Domingo recorda-nos a importância de cuidarmos de nós próprios, pedindo a Deus tudo o que é necessário para viver com qualidade evangélica. Sim, “Aumenta a nossa fé”, dá-nos mais paz interior, mais tempo de oração, mais familiaridade com a Palavra de Deus, mais conhecimento de Jesus Cristo, mais caridade, mais vontade de viver como discípulos de Jesus, colocando os nossos pés nos caminhos do Mestre. A nossa fé, mesmo que goze de boa saúde, tem de ser sempre cuidada e alimentada. Mas, será que precisamos de ter fé? É necessário ter fé para nos sentirmos mais seguros na nossa vida, nas nossas decisões, na nossa caminhada de discípulos? É muito importante pedir a Deus que aumente a nossa fé, especialmente nos nossos dias em que vemos, na Igreja e no mundo, acontecerem coisas que nos podem perturbar e gerar insegurança, se não nos perguntarmos o que é que Deus está a querer dizer e que resposta espera de nós.
A ideia de ordenar, de mandar, é muito mal vista nos nossos dias, pois temos muito apreço pela nossa liberdade individual. Mas, se olharmos cuidadosamente os mandamentos, que são a expressão clássica daquilo que Deus nos manda, damos conta que o que Deus manda é que O amemos e que nos amemos uns aos outros. A primeira carta de S. João diz-nos claramente: “quem não ama a seu irmão, ao qual vê, como pode amar a Deus, que não vê?” (1Jo 4,20). Deus pede que façamos aos outros o que gostamos que os outros nos façam. Aquele servo, que andou a lavrar ou a guardar gado, ao regressar a casa, tem de cuidar do seu senhor e preparar-lhe as refeições. Este escravo sou eu, a quem Deus me convida a ser feliz, celebrando a ceia do meu senhor, ou seja, a Eucaristia: pão e vinho sobre a mesa; corpo entregue e sangue derramado na cruz. Eu sirvo o meu senhor, quando, na minha vida, imito o meu senhor na entrega, mas também, como nos propõe o evangelho de São João, quando lavo os pés aos outros, recordando o que Ele nos diz: “Tudo o que fizerdes ao mais pequenino dos irmãos, é a Mim que o fazeis” (Mt 25,40). Adoramos e servimos Jesus Cristo, quando ajudamos os nossos irmãos, mesmo que nos sintamos atraídos por outras formas de adoração.
“Somos inúteis servos: fizemos o que devíamos fazer!”. O que quer isto dizer? Cumpre o teu dever! Vai viver a Eucaristia com os teus irmãos, preparando a ceia para os teus irmãos, lavando os pés aos predilectos de Jesus.
Para ser um digno servo de Deus e dos irmãos, é muito importante o dom da fé. Nunca deve estar longe da nossa oração esta prece: “Senhor, aumenta a nossa fé”. Mas, qual é o perfil da fé cristã? 1) É uma atitude de confiança em Deus, sustentada pela paciência divina, porque o tempo de Deus não é o tempo dos homens, na certeza de que a Palavra de Deus não falhará; 2) É um dom de Deus, alimentado pela Palavra e pela assistência do Espírito Santo; 3) É, igualmente, um risco. Acreditar é arriscar na Palavra do Senhor, sabendo que “para Deus nada é impossível”; 4) A fé reveste-se de uma grande dose de inutilidade. Quem vive pela fé não vive à procura de méritos nem de condecorações, nem faz as coisas porque isso lhe traz mais visibilidade, reconhecimento, utilidade ou benefícios pessoais. A fé é fazer aquilo que deve ser feito: em cada momento agir com critérios evangélicos e buscar a santidade de vida.
LEITURA ESPIRITUAL
«Somos inúteis servos»
Eu, que era um tosco fugitivo e sem instrução, eu, que não sei prever o futuro, sei, no entanto com certeza uma coisa: que, antes de ser humilhado, era como uma pedra num lodaçal profundo. Mas Ele veio, o Todo-poderoso e, na sua misericórdia, pegou em mim, ergueu-me e colocou-me em cima de um muro. Por isso, elevarei bem alto a minha voz, para devolver ao Senhor uma parte dos seus benefícios, aqui na Terra e na eternidade, benefícios tão grandes que o espírito do homem não pode contá-los.
Ficai, pois, admirados, «grandes e pequenos que temeis a Deus» (Ap 19,5); e vós, senhores bem-falantes, escutai e examinai atentamente. Quem me suscitou, a mim, o insensato, do meio daqueles que passam por sábios, doutores da lei de palavras poderosas e de tantas outras coisas? Quem me inspirou, mais que a outros, a mim, o refugo deste mundo, para «no temor e no respeito» (Hb 12,28), fazer lealmente bem ao povo ao qual me levou o amor de Cristo e a quem Ele me deu, para que, se eu for digno disso, O sirva toda a minha vida com humildade e verdade?
Por isso, «segundo a medida da minha fé» (Rm 12,6) na Trindade, fui chamado a reconhecer e proclamar o dom de Deus e a sua consolação eterna; a propagar, sem medo mas com confiança, o nome de Deus em toda parte (Sl 118,67), para deixar uma herança aos meus irmãos e aos meus filhos, a tantos milhares de homens que baptizei no Senhor. (São Patrício, c. 385-c. 461, monge missionário, bispo, Confissão, 12-14).