Luís Miguel Condeço
Professor na Escola Superior de Saúde de Viseu
As notícias das últimas semanas têm deixado mães e pais assustados, por isso tentei perceber o que de facto significa uma urgência, mas a busca pelo étimo latino deixou-me ainda mais baralhado. Contudo, alguns famosos dicionários definem urgência como algo que é urgente (!), ou uma situação de urgência ou de emergência, ou ainda uma ação indispensável e imprescindível.
Na última segunda-feira do mês de agosto, em Portugal Continental tínhamos várias urgências, ou melhor, serviços de atendimento de pessoas com situações de doença urgente ou emergente, que se encontravam encerrados (sem resposta) ou com condicionamentos (horário reduzidos ou com necessário encaminhamento). Para as pessoas adultos que necessitavam de uma Urgência Geral, 4 destes serviços estavam condicionados. Para as mulheres grávidas que necessitavam de observação em contexto hospitalar, tinham 3 serviços encerrados e 6 condicionados. Já as crianças e adolescentes não poderiam recorrer a um dos serviços continentais (encerrado), mas poderiam fazê-lo com alguma dificuldade a 10 deles que estavam condicionados. Perspetiva assustadora!
No ano em que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) comemora os seus 45 anos de existência (já no próximo dia 15 de setembro), ao longo dos quais sempre procurou “de forma articulada e sob direcção unificada, gestão descentralizada e democrática, a prestação de cuidados de saúde globais a toda a população”, estarão os cuidados de saúde hospitalares a ficar à margem deste ideal plasmado na Lei de Bases da Saúde?
Na última década o desgaste e falta de investimento no SNS, tem sido notório mesmo para o mais distraído dos portugueses. A baixa taxa de enfermeiros per capita (segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico), os milhares de cidadãos sem médico de família, a difícil redução das listas de espera cirúrgica (apesar das inúmeras cirúrgicas a pessoas com doença oncológica nos últimos meses), as precárias condições de trabalho e a fraca atratividade do setor público da saúde, tem provocado uma “migração” massiva para o setor privado.
Nos distritos do interior do “nosso” território, as unidades hospitalares privadas têm-se disseminado e crescido, quer em colaboradores como nas valências disponibilizadas aos “seus” clientes, é a economia em “tempo real” – a procura faz aumentar a oferta.
Há 45 anos, António Arnaut “sonhava” com um SNS aberto a todos e para todos, tendencialmente gratuito, que prestasse cuidados de saúde globais e ajustados a cada população e comunidade. Mas o paradigma tem mudado. Resta saber se os nossos concidadãos, parcos de recursos económicos, conseguem satisfazer as suas necessidades em cuidados de saúde.
Acredito que para a governação da tutela (da saúde), não se avistam bonanças, apenas longos meses de tempestade, com um início de inverno semelhante ao do ano passado (com greves, recusas a mais horas extraordinárias e o aumento exponencial de episódios de urgência, como é costume nesta época sazonal).
Para os menos informados, recomenda-se uma visita ao portal da internet do SNS quando necessário (e espera-se que seja pontual), para conhecerem o panorama da oferta de unidades de saúde/atendimento às situações de saúde urgentes.
Na última segunda-feira do mês de agosto, as populações das terras de D. Sancho I e de Viriato encontraram os seus serviços da saúde abertos e disponíveis, apesar das extremas dificuldades laborais que os profissionais do SNS têm vindo a superar. No futuro, se verá.