Autor
Luís Miguel Condeço
Professor na Escola Superior de Saúde de Viseu
Além do início das principais festas e romarias, agosto evoca o Dia Mundial do Cancro do Pulmão (no primeiro dia do mês). Este dia procura sensibilizar a população para a principal causa de morte por cancro em Portugal (16% do total de mortes por cancro), segundo os dados de 2021 do Instituto Nacional de Estatística.
Hoje a evidência científica, resultante de diversas investigações ao longo das últimas décadas não deixam esconder a íntima relação entre o consumo ativo do tabaco (tabagismo) ou passivo (exposição ocasional ao fumo), e o risco de desenvolver cancro do pulmão (responsável por 90% de todos os cancro do pulmão), situação que poderia ser evitável.
Reconhecido como uma doença, o tabagismo carateriza-se pelo consumo de produtos resultantes do tabaco e que contêm nicotina, de uma forma continuada e dependente. O fumo do tabaco contém vários químicos (mais de 7000), dos quais cerca de 70 são cancerígenos. A Organização Mundial da Saúde considera o tabagismo como a principal causa de morte evitável no mundo (cerca de 16 mil mortes por dia), declarando-o como um problema de saúde pública, ou até como uma pandemia que deve ser combatida. Estima-se que na Europa, o consumo de tabaco é responsável por 16% de todas as mortes na população adulta com mais de 30 anos de idade.
Mas, nem sempre foi assim.
A planta do tabaco ou a Nicotiana Tabacum, como é conhecida desde o século XVI, altura em que foi introduzida na Europa mais propriamente na corte francesa, é uma planta de folhas largas e flores amarelas e rosa, que já se cultivava na região dos Andes na América do Sul há mais de cinco mil anos. E as indústrias transformadoras e comercializadoras dos produtos obtidos a partir do tabaco tiveram desde o início do século passado uma série de estratégias publicitárias e de marketing encorajando ao consumo dos cigarros.
A imagem do cigarro começou por ser associada ao luxo, ao glamour, e mais tarde à rebeldia e independência. Durante várias décadas esteve presente em anúncios, spots comerciais e cartazes, além de aparecer em vários filmes e entrevistas aos famosos atores de Hollywood, como o caso de Humphrey Bogart (o galã de Casablanca de 1942) ou de Jon Hamm (o publicitário da premiada série Mad Men já deste século). No entanto, nunca a publicidade teve tanto impacto no consumo de cigarros como o esforço feito pela Philip Morris (empresa tabaqueira norte-americana), primeiro na década de 50 do século passado com a criação do Homem da Marlboro (cowboy americano, solitário e de espírito livre no meio das pradarias, protagonizado pelo ator Robert Norris que nunca fumou e que morreu em 2019 aos 90 anos de idade), e mais tarde pela aposta no desporto automóvel, da qual resultou uma das parcerias mais duradouras e lucrativas de sempre, entre a tabaqueira e a McLaren que durou 23 anos e que nos traz à memória os “bólides” de Ayrton Senna ou de Alain Prost.
Apesar dos estudos epidemiológicos realizados na primeira metade do século XX, só na década de 60 desse século é que ficou cientificamente estabelecida a relação entre o tabaco e o cancro do pulmão, contudo as medidas de prevenção, diagnóstico e tratamento foram sendo politicamente adiadas na sequência de um movimento independente, “de vontade própria” e do “livre-arbítrio” do comum dos cidadãos.
Em 2007, com a publicação da Lei n.º 37/2007 de 14 de agosto, Portugal passou a ter legisladas orientações, recomendações e restrições quanto à venda, consumo, publicidade, promoção e patrocínio de produtos de tabaco, tornando-se efetivas algumas das medidas de prevenção do consumo desta substância.
Há regimes mundiais mais rígidos, como o Butão (reino asiático na extremidade leste dos Himalaias) onde é proibido comercializar cigarros desde 2010 ou a Nova Zelândia (na Oceânia) que proíbe a venda de cigarros a cidadãos nascidos depois de 2009.
Mais importante que restringir ou impor uma medida, é fundamental sensibilizar as crianças e jovens para os efeitos nocivos da inalação de um ar poluído com o fumo do tabaco.