Numa altura em que todos os jovens estão agarrados aos telemóveis e apenas comunicam por mensagens utilizando a escrita inteligente ou abreviaturas, verificamos, seja qual for a disciplina, que os nossos alunos são preguiçosos, pouco pensam, mal falam ou nada argumentam.
A reflexão, o pensamento crítico, a arte de escrever e falar bem rareiam nas salas de aula. Dá-se importância à nota final, por causa do acesso ao ensino superior, no entanto, verificamos que, quando os alunos sobem para esse patamar, os resultados já não são os mesmos.
Cabe-nos a nós professores, remar contra esta maré das novas tecnologias, importantes, sem dúvida, mostrando-lhes que o que pensamos, o que dizemos e o que escrevemos fazem parte da engrenagem do motor do desenvolvimento da sociedade. A transmissão de conhecimentos, a partilha de ideias, os poderes argumentativos são catalisadores da formação de cidadãos e profissionais de mérito. Os conteúdos das disciplinas relevam para o enriquecimento de diversas competências, mas não bastam. Urge promover a curiosidade, o querer saber mais, conhecer o mundo, compreendê-lo, questionar, promover o debate de ideias e soluções para um futuro que se avizinha, cada vez mais crítico. Urge dar-lhes as ferramentas adequadas para que usem a sua voz e a sua escrita, para espelharem as suas vontades, as suas opiniões, o seu pensamento crítico.
Não obstante a correção linguística e a riqueza lexical qualificarem um texto, esse mesmo texto só se tornará interessante, se cumprir o seu objetivo: ação. Quando escrevo, penso no que irá pensar o meu leitor, se conseguirei movê-lo a refletir sobre o assunto, se o meu texto terá algum impacto. São questões às quais raramente obtenho respostas, no entanto, escrevo porque gosto, tenho a tal teimosia de falar sobre qualquer assunto, de expressar, sem rodeios e medos, a minha opinião. Ainda que não concordem com ela, terei alcançado o meu objetivo. Acreditem. Sei fui lida, por alguns, e que os meus leitores pensaram sobre o assunto.
Ser professora de Português, por acaso, a melhor e mais importante de todas as disciplinas do currículo, é desafiante. Melhor e mais importante? Perguntarão alguns. Verdade. Digo-o, no início de cada ano, a todos os meus alunos. Não serão bons alunos às outras disciplinas, se não souberem escrever bem, interpretar e falar bem.
Ser professora de português é desafiante porque permite-me, ao longo do ano, explorar os conhecimentos dos meus alunos, permite-me ouvi-los, atiçar a curiosidade sobre qualquer assunto, sem nunca fugir ao planificado. A análise de qualquer texto, de um artigo de opinião ao texto poético ou dramático, dá-me inúmeras possibilidades para dar-lhes voz, para terem confiança em si próprios, para ganharem autoestima e serem ativos fora da sala de aula. Gosto quando um aluno discorda de uma opinião, gosto quando um aluno, a propósito de um texto, opina sobre a crise em que vivemos, quando questiona o autor. Qualquer dinâmica, numa aula, promove a arte de bem falar e de bem escrever. O erro pertence às nossas aulas, cabe-nos corrigir, ensinar a não repeti-lo, fazer da “maldita” gramática a receita doce que enriquece o nosso discurso escrito e falado. A gramática não pode ser uma aprendizagem isolada na aula de português, deve ser complementar, deve ser entendida pelos alunos como um domínio que se cruza com os restantes; a leitura, a escrita, a oralidade, a educação literária.
A promoção da leitura, em papel, não é tarefa fácil. Os nossos alunos não gostam de ler, nem tão pouco têm acesso aos jornais ou revistas em papel, porque não lhes interessa, dizem eles. Por outro lado, também já começaram a entrar no hábito de ler livros em formato digital. Meu Deus! Como é possível ler “os meus queridos” Os Maias ou O Memorial do Convento ou qualquer outro romance, num telemóvel?! O prazer do cheiro que temos ao abrir um livro ou de folhear as páginas, já não são uma realidade, para os nossos alunos. Eles não sabem o que perdem! Perdem e muito. Perdem as narrativas, os enredos, os vocabulários, a História dentro da história, os jogos de palavras, as ironias, as metáforas, perdem os sonhos, o amor, os dramas e as lições.
A ausência de hábitos de leitura e de escrita tem multiplicado um número assustador de alunos que não conseguem ter opinião sobre assuntos tão importantes e do quotidiano, como as alterações climáticas, a pobreza, as consequências da guerra, a participação cívica na sociedade, a importância das nossas tradições. A falta de uma bagagem cultural não lhes permite pronunciar-se e fundamentarem um assunto que lhes seja proposto.
Em diversos textos tenho apelado à ação da nossa juventude na sociedade, na comunidade escolar, existem inúmeros projetos, nas escolas, no CLDS 4G, que lhes permitem desenvolver competências de cidadania e promover valores essenciais à sua formação enquanto pessoa. Ao longo de doze anos, temos, enquanto professores, o privilégio de melhorar o nosso futuro, formando cidadãos interventivos e ativos, anulando a inércia e o comodismo.
Ainda que escrevam nas redes sociais, os nossos alunos conseguem melhorar a sua escrita, multiplicam as suas ideias, promovem comentários e reflexões. A linguagem não pode apenas ser icónica, tem de se tornar, cada vez mais lida. Temos de lhes abrir a porta da comunicação.
Cabe-nos a todos os professores, mas aos pais também, promover esta necessidade de saber escrever bem e falar bem, todos os dias, em qualquer lugar, com interesse, com vontade de ser lido e ouvido, com a certeza que a intervenção pensada, crítica e fundamentada de cada um, somada a outros tantos, terá resultados positivos numa sociedade mais justa e igual.
É a Hora!
Sandra Correia
sandrampcorreia@gmail.com